A legislação trabalhista brasileira sofre de uma forte herança do getulismo e da mentalidade intervencionista e corporativista. E é na legislação sindical que este fato fica ainda mais evidente. Décadas após o fim do regime ditatorial de Getúlio Vargas em 1945, o pensamento dominante quanto à estrutura ideal do sindicalismo continuou praticamente o mesmo.
A legislação brasileira adotou, desde o surgimento das normas estatais para relações trabalhistas, ainda na década de 30, a abordagem coletivista, ou seja, a que prioriza os sindicatos como instituição com objetivos motivados pelo seu próprio fim e não como o reflexo da livre associação de cada pessoa que possa compartilhar objetivos com outras. Com a criação da Constituição Federal de 1988 e a chamada “redemocratização” do País, esta essência coletivista idealizada por Getúlio Vargas foi reforçada mais uma vez, como mostram estes dois principais argumentos:
1- Unicidade Territorial
Este é um princípio bastante simples. Ele pressupõe que dentro de uma mesma base territorial (ou seja, os limites geográficos de atuação determinado pela Assembléia Geral da entidade sindical ou os limites de um determinado Município) não poderá coexistir dois ou mais sindicatos representando uma mesma categoria.
Essa ideia surgiu no Brasil em 1931, com o Decreto 19.770, artigo 9º, assinado por Getúlio Vargas e o ministro do Trabalho, Lindolfo Collor, em atuação. Mais tarde, Lindolfo tornou-se avô daquele que hoje chamamos de ex-presidente mais jovem do país, o primeiro a sofrer impeachment e atual senador, Fernando Collor.
O principal motivo de manter esta restrição era manter apenas os sindicatos alinhados com o Governo na legalidade e usar os mesmos princípios legalistas para anular qualquer entidade dissidente. É importante lembrar que os sindicalistas nas primeiras décadas do século XX compunham uma grande oposição a maioria dos governos que existiram até então, o que, é claro, acabou com a ascensão de Getúlio Vargas e sua distribuição de privilégios aos sindicalistas amigos do rei.
A Constituição Federal de 1988 trouxe algo interessante em seu texto. Assegurou por força legal que toda associação de trabalhadores ou empregadores será livre, mas como constam no parágrafo seguinte, estarão sujeitas ao monopólio sindical das entidades pré-estabelecidas. Penso comigo que faltou alguém para pedir a palavra durante a Assembléia Constituinte e dizer quatro palavras, apenas quatro: NÃO EXISTE MEIA LIBERDADE! Como isso não aconteceu, o monopólio das entidades continua intacto, gerando consequências que muitos de nós já conhecemos.
1) Sindicatos não precisam oferecer um bom serviço para que os trabalhadoras tenham interesse em se associar, pois não existem alternativas;
2) Como não existe concorrência, logo não existe incentivo para melhoria dos serviços dos sindicatos. Não há risco de perder associados para outra entidade;
3) Ocorre o aparelhamento político dos sindicatos, que financiados e protegidos, passam a atuar como um mero braço do governo.
Enquanto há lugares onde a efetiva concorrência entre sindicatos promove a oferta de convênios, descontos em universidades, empréstimos a juros mais baixos aos filiados e diversos outros benefícios para manter o associado, no Brasil temos sindicatos com poucos filiados marchando contra o golpismo e realizando “manifestações” com o dinheiro fácil que entra em seus cofres.
Para alguns setores de esquerda, o argumento jurássico em defesa da unicidade sindical que vigora, é a grande desculpa de que sem o monopólio territorial haveria uma concorrência selvagem entre entidades e isso acabaria enfraquecendo a força de cada sindicato, acabando com a representatividade e permitindo que as engrenagens do capitalismo triturassem os trabalhadores. E como outros argumentos, este é uma grande mentira.
No Brasil, de acordo com dados do Ministério do Trabalho e Emprego existem hoje mais de 16 mil (sic!) entidades sindicais registradas. Muitas delas são fantasmas, ou seja, só existem no papel e servem como ferramenta para desvio de dinheiro.
Há casos extremos como o do homem que foi presidente do mesmo sindicato por 40 anos que, após sua morte, passou a ser controlado pelo seu filho. Além disso, diversas pessoas da mesma família recebiam salários que variavam de 10 mil a 60 mil reais sem sequer comparecer regularmente ao trabalho.
Não há opinião melhor para ilustrar mais este abuso estatal que a de Jair Meneguelli, fundador da Central Única dos Trabalhadores – CUT, que disse “ser dirigente sindical no Brasil virou uma profissão das boas”.
“Profissão” é bondade desse senhor. Abrir um sindicato Brasil é mais rentável e mais seguro que arriscar-se em qualquer empreendimento de pequeno ou médio porte, e este risco, que tende a zero, nos leva ao segundo argumento pela abolição do atual sistema sindical brasileiro.
2- Imposto Sindical
Trata-se do desconto em folha que é recolhido e destinado aos sindicatos ano após ano. Conhecido como “contribuição sindical”, trata-se de uma grande ironia, pois ele é obrigatório, o que facilita sua aceitação. O que traz mais indignação é que este imposto é descontado mesmo sem a efetiva sindicalização do trabalhador. Em outras palavras, você pode escolher não participar de um sindicato por não se sentir representado, mas ainda assim será obrigado financiar esta entidade e suas as atividades.
Sob o governo ditatorial de Getúlio Vargas, a Constituição de 1937 inovou em técnicas de espoliação e apresentou a “surpresa” conhecida como desconto obrigatório. Em 1940 com o Decreto 2.377, o desconto adquiriu o nome daquilo que verdadeiramente é: um Imposto Sindical, que apesar dos atuais esforços para mudar completamente a percepção dos seus objetivos, a sua história e essência continuam as mesmas.
Esse “pequeno” desconto equivale a “apenas” um dia de trabalho de cada funcionário, o que a princípio pode parecer pouco, mas quando multiplicado pelo total de trabalhadores, transforma o sindicato em um empreendimento extremamente lucrativo. Um dos melhores para se ter.
Segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego, a arrecadação do Imposto Sindical em 2015 chegou ao montante de R$ 3.403.883.140,55. Para ter uma ideia, a arrecadação de 2007, apenas 8 anos antes, teve o total de R$ 1.249.965.401,33.
Em 2013 estes valores chegaram a 3,2 bilhões ficando na casa dos R$ 3,3 bilhões em 2014. Tente imaginar esse desconto perverso ao longo de 70 anos. É mais que pão com mortadela que motiva o braço do governismo no país. A distribuição do espólio feito pelo imposto sindical é feito da seguinte forma:
1. 60% para financiamento dos sindicatos;
2. 15% para financiamento das federações;
3. 5% para financiamento das confederações;
4. 5% para a Conta Especial Emprego e Salário – CEES – vinculada ao próprio Ministério do Trabalho e Emprego e;
5. 10% para financiar as Centrais Sindicais.
Para alguém de ética relativa e moral extremamente flexível, o que vale mais a pena? Abrir uma empresa para criar produtos de qualidade ou abrir um sindicato?
Felizmente há uma perspectiva um pouco animadora neste cenário. O PL-870 de 2015 tem por finalidade enterrar de vez essa herança maldita do getulismo e acabar com o imposto sindical no Brasil. Isto não acabaria com todos os problemas que o trabalhador enfrenta com o estado, mas já é um primeiro passo para dar fim a espoliação do trabalhador e acabar com a verba fácil que deixa os sindicatos subservientes ao governo.
Existem questões menores que também prejudicam o trabalhador e suas relações de trabalho, mas os tópicos abordados neste artigo cobrem os principais problemas. Mudanças gradativas e com resultado comprovado podem ao longo do tempo favorecer situações de livre associação muito mais benéficas para o trabalhador, sua família que irá dispor de mais recursos e toda a economia.
Para mais detalhes sobre o assunto recomendo o livro “O Sindicalismo Brasileiro Clama por Socorro” de Fernando Alves de Oliveira.