No início da década de 1950, a Coreia do Sul tinha uma renda per capita próxima à brasileira. É claro que a Guerra da Coreia (1950 – 1953) tem efeito nesta estatística, mas a proximidade entre a renda per capita dos dois países permaneceu até bem depois do final da guerra.
De acordo com os dados da Penn World Table (PWT), a renda per capita da Coreia do Sul era 80% da brasileira em 1953, ano em que terminou a guerra, e em 1977 ainda estava no mesmo patamar. Entre 1953 e 1980, o maior valor da renda per capita da Coreia do Sul em relação ao Brasil foi de 87% em 1979 e o menor foi de 61% em 1962. No começo da década de 1980, a renda per capita sul-coreana ultrapassou a brasileira: em 1983 era 12% maior, cresceu ainda mais e em 2011 o sul-coreano médio tinha uma renda mais de três vezes maior que a do brasileiro médio. Os números mudam a depender da medida de renda per capita, mas a história é sempre a mesma. A partir da década de 1980, a Coréia do Sul ultrapassou o Brasil e seguiu uma trajetória de crescimento enquanto nós ficamos quase estagnados. A figura abaixo ilustra esta história.
Um motivo frequentemente apontado para explicar a diferença nas trajetórias de Brasil e Coreia do Sul é o desempenho da educação. A tese é que os sul-coreanos investiram em educação e o Brasil não. Aceitando a tese, teríamos na Coreia do Sul um exemplo de como a educação pode colocar um país em trajetória de crescimento sustentado. Entretanto, de acordo com os dados da ONU, o setor público brasileiro em 2008 gastou 5,53% do PIB em educação o sul-coreano gastou 4,76% do PIB, um padrão não diferente de outros anos.
De posse destes números vários analistas alertaram que aumentar o gasto com educação não é receita certa para resolver o problema da educação brasileira. Os defensores do aumento dos gastos responderam que não é certo comparar o gasto como proporção do PIB, dado que, como a renda da Coreia do Sul é maior do que a brasileira, se os dois países gastam o mesmo percentual do PIB com educação o gasto absoluto sul-coreano é maior. De acordo com os números da PWT, o governo da Coreia do Sul gasta, em média, U$ 1.295 em educação por pessoa, enquanto o governo brasileiro gasta, em média, U$ 460 por pessoa.
O argumento procede, afinal, uma pessoa muito rica pode gastar menos de 1% da própria renda para manter o filho na melhor escola da cidade, enquanto alguém com uma renda mais modesta pode gastar 10% de sua renda para manter seu filho em uma escola bem pior. No final, o fato de um gastar menos de 1% da renda com a educação dos filhos e o outro gastar 10% da renda com o mesmo serviço não significa que o que gasta mais está dando uma educação melhor e, mais importante, que aumentar o percentual da renda gasta com educação não melhore a educação do filho. Dessa forma, comparar percentual do PIB gasto em educação não ajuda muito quando a renda per capita dos países é muito diferente.
Porém, como vimos, nem sempre o PIB per capita da Coreia do Sul foi tão maior do que o do Brasil, pelo contrário, de 1953 a 1982 foi menor que o brasileiro. Se a disparada da Coreia do Sul em relação ao Brasil foi devida à educação, é o gasto do período em que os coreanos eram “pobres como nós” que deve ser observado, pois foi nesta época que a educação que teria proporcionado a disparada foi construída.
De acordo com os dados da ONU, entre 1975 (primeiro ano da série que encontrei) e 1983, o governo da Coreia do Sul gastou, em média, 2,85% do PIB com educação, bem menos do que o Brasil gasta hoje. Com exceção de 1982 (6,65%) e 2009 (5,02%), o gasto do setor público com educação na Coreia do Sul ficou todos os anos abaixo de 5% do PIB. Infelizmente a base dados que usei não tinha os gastos com educação do Brasil na época que nossa renda era maior do que a da Coreia (a série para o Brasil começa em 1989). Porém, se for considerado o período com dados em comum (tive de fazer algumas interpolações) o Brasil via de regra gastou mais do que a Coreia em proporção ao PIB, com exceção do período entre 2001 e 2005. Os dados estão na figura abaixo.
Cabe salientar que há duas limitações importantes nos dados que usei: (i) são considerados apenas gastos estatais na educação e (ii) não tenho os dados para o Brasil no período em que nossa renda per capita era maior que a da Coreia do Sul. Porém, mesmo com estas limitações, é possível concluir que o problema da educação no Brasil não é a falta de dinheiro. Já passou da trocar o mantra “mais dinheiro” por “melhor gestão”.
E como a educação da Coreia do Sul melhorou tanto nesse período? Considerar os gastos privados pode ajudar nisso, mas daí a conclusão seria que não é o governo que deve gastar mais com educação, mas sim permitir que a iniciativa privada o faça livremente.