A CEAP (Cota para Exercício da Atividade Parlamentar), criada em 2009 pelo então deputado federal Michel Temer, é uma cota destinada a custear eventuais gastos dos parlamentares durante o exercício do mandato. Entretanto, como bem nos alertou Tom Jobim, “o Brasil não é para principiantes”.
De fato, todo tipo de bizarrice pode ser encontrada observando de perto a utilização da cota. Enquanto verba indenizatória, ela não é entendida como vencimento ou bonificação e, portanto, não está submetida ao teto constitucional (no caso, o salário do Presidente do Supremo Tribunal Federal, atualmente em R$ 33.763,00). A CEAP é, pelo contrário, regulada pelo próprio Congresso Nacional.
Dessa forma, nossos “humildes” congressistas – que já recebem anualmente mais de 10 vezes o PIB per capita nacional, o que facilmente os coloca no 1% mais ricos de nossa população, fora que cerca de metade deles já possui patrimônios milionários – conseguem poupar seus “irrisórios” salários de 5 dígitos ao voar de helicóptero, comer em excelentes restaurantes, alugar os melhores carros e gastar centenas de milhares de reais em passagens de avião, além das próprias regalias inerentes à atividade em Brasília. A CEAP custou a bagatela de 203 milhões de reais aos pagadores de impostos em 2015 e 214 milhões de reais em 2016.
Em de nossas análises da CEAP nos deparamos com algo absurdo. O deputado federal Arnaldo Faria de Sá, do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) de São Paulo, em uma única nota de dezembro de 2016, gastou R$ 184.500,00 reais para imprimir 90.000 estatutos do idoso com capa e 88 páginas. Isso por si só é algo inusitado, mas fica ainda mais interessante: o tão “bem intencionado” congressista mantém esta prática – gastar uma fortuna com a impressão de unidades de estatuto do idoso – todo mês de dezembro, todo ano – é praticamente o presente de Natal da gráfica! Entre 2014 e 2016, foram gastos R$ 582.420,00 em 370.000 unidades do estatuto do idoso, numa média de R$ 1,57 por estatuto impresso. O deputado anuncia o Estatuto – com sua foto na capa, claro – em seu Facebook, pedindo que cada indivíduo informe CEP e endereço nos comentários, por mensagem ou por telefone para receber um exemplar. Cada pedido feito é mais um gasto que onera os cofres públicos sem ter, aparentemente, qualquer critério.
Infelizmente, só há notas fiscais dos gastos em PDF a partir de 2014, e portanto, de 2009 até 2013 não é possível saber em que o deputado gastou, nem o detalhe dos gastos. Entretanto, é possível deduzir que o deputado manteve o padrão de gastar com a impressão de unidades do estatuto do idoso, dado que as quantias são semelhantes, sempre no mesmo mês, na mesma “subcota” (Divulgação da Atividade Parlamentar) e sempre numa gráfica. Nesse período, de 2009 até 2013, o deputado gastou um total de R$ 873.220,00, sem ser possível precisar quantas unidades do estatuto do idoso foram imprimidas com esse valor (e se foram).
Utilizando o valor médio por unidade do Estatuto do Idoso nos anos em que foram disponibilizadas as notas fiscais (2014, 2015 e 2016), podemos supor que entre 2009 e 2013 foram produzidos 556.191 unidades do Estatuto do Idoso. Somando o valor comprovado pelo Portal da Transparência e a quantidade comprovada pela nota fiscal somada a quantidade deduzida por nós, obtemos o valor de R$ 1.455.640,00 na produção de 926.191 unidades do estatuto do idoso.
Arnaldo Faria de Sá, de acordo com seu site, está em seu oitavo mandato, é contabilista, advogado, professor e vice-líder do PTB, foi Secretário Municipal de Esportes da cidade de São Paulo entre 1993 e 1994 (na gestão Paulo Maluf) e se declara de “centro-esquerda”. Arnaldo também é coordenador e fundador da Frente Parlamentar em Defesa da Previdência Pública e diz ser conhecido como “deputado dos aposentados, pensionistas e idosos, causa a que se dedica de forma permanente”. Diz ainda ser um “político independente” e aliado fiel dos trabalhadores (mas não do dinheiro deles).
Para “lutar pelos trabalhadores e aposentados” o deputado achou uma boa ideia imprimir anualmente milhares de cópias do Estatuto do Idoso – disponível para livre consulta na Internet –, custando mais de 1 milhão de reais aos pagadores de impostos num exemplo do que acontece quando permitimos que outra pessoa gaste nosso dinheiro com outras pessoas, como bem disse Milton Friedman.