O crescimento do liberalismo no Brasil é facilmente observável, vê-se que as pessoas têm se indignado cada vez mais com o governo e, além disso, compreendido que este age como terceiro nas relações sociais de uma forma que pode ser dispensável. Em razão do aumento de pessoas adeptas a estas ideias, é notável que os adeptos das demais vertentes ideológicas tentem apropriar para suas vertentes pautas que foram levantadas pelo liberalismo. Os esquerdistas, por exemplo, apropriam para si discursos e fundamentos usados pelos liberais anteriormente para defesas de pautas de liberdade civil.
Todavia, há grande diferença entre as pautas levantadas pela esquerda e as liberais, logo se faz necessário que sejam demonstradas essas diferenças de forma a evitar a confusão entre linhas de pensamento distintas, bem como evitar que as pessoas compreendam de forma errada a realidade sobre determinada linha de pensamento e incorram no erro de “refutar” coisas que jamais foram ditas por aqueles que são supostamente refutados (a famosa “falácia do espantalho”).
A esquerda defende que suas pautas sejam postas em prática por meio do intervencionismo estatal. Os adeptos da doutrina liberal, todavia, não defendem bandeiras específicas no tocante as liberdades civis como os primeiros o fazem. Os liberais entendem que o alcance da liberdade na sociedade se dará ao retirar a intervenção estatal das relações privadas. Ou seja, os liberais defendem e buscam alcançar a liberdade que não ocorre exatamente em razão do intervencionismo do estado. Já a esquerda compreende que as pautas de “liberdade” civil devem ser garantidas por meio do estado com a criação de normas jurídicas que regulem atos privados para evitar que as liberdades sejam violadas.
Cito alguns exemplos que auxiliam neste entendimento. Enquanto a esquerda deseja a regulação estatal da união homossexual e das drogas, os liberais defendem o livre contrato privado – que permitiria, consequentemente, a união homossexual – bem como a descriminalização das drogas e não apenas a legalização estatal (descriminalização aliada à regulação). A esquerda defende a regulação, ainda que apoie a descriminalização, porque acredita que o mercado não funcionaria sozinho.
“Imaginam os intervencionistas que, se as pessoas forem deixadas livres para usarem os seus recursos, não o farão da melhor maneira. A intervenção, pois, se faz necessária para obrigar os indivíduos a agirem de forma diferente da que agiriam se fossem deixados livres. Presume-se que, assim procedendo, as pessoas em geral serão beneficiadas. Essa é a lógica da intervenção.” (STEWART JR, 1995, p. 27).
É portanto errôneo afirmar que o liberalismo seja a “nova esquerda”, tendo em vista que as premissas das duas doutrinas são completamente distintas. As questões imediatas que ambas buscam resolver podem ser eventualmente as mesmas, mas a compreensão do sistema é completamente distinta, sendo impossível chegar a um mesmo resultado. O escopo do liberalismo é a redução da pobreza e melhoria das condições de vida do indivíduo tendo por meio do respeito à vida, liberdade e propriedade, bem como por meio da cooperação entre indivíduos.
O erro daqueles que confundem estas diferentes visões decorre da falta de conhecimento acerca das premissas que norteiam o liberalismo e da retirada dos conceitos e ideias do contexto da doutrina. Dessa forma, em razão de algumas pautas da esquerda serem trazidas ao estudo do liberalismo por se tratarem de possíveis liberdades afrontadas pelo estado, algumas pessoas incorrem no erro crasso de acreditar que as ideias se confundem, quando tais ideias podem, muitas vezes, não ser consenso mesmo entre aqueles que se identificam com a doutrina liberal. O aborto ou as políticas de imigração, por exemplo, não são consenso nem entre os próprios autores da Escola Austríaca, o que não significa que suas contribuições devem ser desconsideradas no ambiente acadêmico, dado que geralmente são inovadoras e estimulam o debate que leva ao conhecimento.