Após a morte prematura dos pais, Joaquim José da Silva Xavier perdeu as propriedades da família para pagamento de dívidas e não pôde ter acesso a estudos regulares, ficando sob tutela de seu tio e padrinho Sebastião Ferreira Leitão, um cirurgião dentista. Trabalhou como mascate (vendedor ambulante) e minerador, bem como se dedicou às práticas farmacêuticas e odontológicas, o que lhe valeu o apelido de Tiradentes.
Após conseguir a licença de técnico em reconhecimento de terrenos e exploração dos seus recursos, em 1780 alistou-se na tropa da Capitania de Minas Gerais e no ano seguinte foi nomeado comandante do destacamento dos Dragões na patrulha do “Caminho Novo”, estrada que servia como rota de escoamento da produção mineradora da capitania mineira ao porto do Rio de Janeiro. A partir desse período, Tiradentes começou a se aproximar de grupos que criticavam o domínio português sobre as capitanias por onde circulava. Pediu licença da cavalaria em 1787, insatisfeito por não conseguir promoção na carreira militar – onde tinha apenas o posto de alferes, patente inicial do oficialato – e por ter perdido a função de marechal da patrulha do Caminho Novo.
Tiradentes morou um ano na cidade carioca, idealizou projetos como a canalização dos rios Andaraí e Maracanã para a melhoria do abastecimento de água no Rio de Janeiro, mas não obteve aprovação para a execução das obras. Quando voltou às Minas Gerais, começou a propagar em Vila Rica e arredores os ideais de independência daquela capitania. Fez parte de um movimento aliado a integrantes do clero e da elite financeira mineira, que obteve reforço ideológico com a independência das colônias inglesas da América do Norte e a formação dos Estados Unidos, pautada a época, no famoso alicerce:
Consideramos estas verdades como auto evidentes, que todos os homens são criados iguais, que são dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, que entre estes são vida, liberdade e busca da felicidade.
Naquela época, oito de cada dez alunos brasileiros em Coimbra eram das Minas Gerais, o que possibilitou a elite regional ter acesso aos ideais liberais que circulavam na Europa, os quais, associados a fatores mundiais e religiosos, fundamentaram a articulação da conspiração na Capitania de Minas Gerais. Além disso, com a nomeação de Luís da Cunha Meneses como governador da capitania em 1783, teve início a marginalização de parte da elite local enquanto o grupo de amigos de Luís era favorecido, como ocorre ainda hoje na endêmica cultura corporativista brasileira.
Com a constante queda na receita do governo imperial devido ao declínio da atividade mineradora, a Coroa resolveu, em 1789, iniciar o mecanismo da derrama, uma medida administrativa que permitia a cobrança forçada de impostos mesmo que fosse preciso prender o cobrado. Esta medida, absurda para a época mas tão comum nos dias de hoje, garantia ao império a arrecadação das receitas oriundas do Quinto, 20% de todo minério extraído no Reino de Portugal e seus domínios. Com esta medida impositiva, de clara extorsão, o sentimento de revolta na região atingiu seu máximo.
Os principais planos dos inconfidentes incluíam estabelecer um governo republicano independente de Portugal, criar indústrias na província das Minas Gerais – até então inexistentes, as primeiras surgiriam por volta de 1840 -, estabelecer uma universidade em Vila Rica – a primeira foi surgir em Manaus, em 1909 – e fazer de São João Del-Rei a capital. Seu primeiro presidente seria Tomás António Gonzaga, por três anos, e em seguida haveria eleições. Nessa república não haveria exército, em vez disso, a população permanentemente armada formaria uma milícia quando necessária.
Os líderes da sedição decidiram que sairiam às ruas de Vila Maria dando vivas à República e esperavam ganhar a imediata adesão da população. Mas antes que a conspiração se transformasse em revolução, ela foi delatada aos portugueses, em 15 de março de 1789, pelo coronel Joaquim Silvério dos Reis, pelo tenente-coronel Basílio de Brito Malheiro do Lago e pelo luso-açoriano Inácio Correia de Pamplona, em troca do perdão de dívidas com a Real Fazenda. Negando a princípio sua participação, Tiradentes foi o único a, posteriormente, assumir toda a responsabilidade pela “inconfidência”, inocentando seus companheiros.
Toda a mobilização de Vila Rica, nas Minas Gerais do século XVIII, teve sua origem nos excessos de intervenção estatal. No abuso do corporativismo que favorece poucos e prejudica uma maioria, na exploração da iniciativa privada por um estado perdulário que arrecada muito e não traz benefício algum a sociedade onde está inserido. Segundo o IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação), a carga de impostos pode passar de 40% do PIB em 2016. Isto significa que, em pleno século XXI, um trabalhador CLT de rendimentos médios tem sua renda comprometida em até 70% por impostos diretos e indiretos. Dentre os 30 países com as maiores cargas tributárias do planeta, o Brasil proporciona o pior retorno pelos tributos em todas as esferas estatais.
Tiradentes se revoltou contra o quinto, contra os 20%. Quando os brasileiros atuais irão se revoltar contra os dois quintos, os 40% tomados pelo estado todos os dias?