Quem é de humanas (eu inclusa) provavelmente já ouviu na faculdade diversas críticas aos horrores e excessos cometidos no período do regime militar. Na verdade você não precisa necessariamente ser de humanas, visto que somos constantemente relembrados de tudo que aconteceu naquela época para que não seja algo que possa se repetir posteriormente. Uma das maiores críticas é a respeito da censura sofrida naquela época. Entretanto, afirmo que a censura apenas assumiu outro nome e hoje chama-se “politicamente correto”.
O politicamente correto não passa de moralismo travestido de consciência política neutra e isenta de preconceitos. Basta ver que, nos tempos atuais, é feio falar em nome da moral porque esta lembra conservadorismo. Na verdade, tudo não passa de uma desculpa para que o estado tenha o poder fiscalizar o que as pessoas falam, principalmente se é algo que desagrada a cartilha da esquerda. A patrulha politicamente correta é tão repressiva quanto qualquer moralismo velho.
Dois episódios recentes onde a patrulha politicamente correta mostrou sua face me chamaram a atenção. O primeiro foi a onda de revolta nas redes sociais em razão da esponja black power utilizada na cozinha da casa do Big Brother Brasil (BBB), onde a Globo foi acusada de ser racista. Um dos participantes do reality, inclusive, ficou revoltado com a esponja e questionou “por que tem que ser negro?”. Coincidência ou não, ele é de humanas, estudante de filosofia. O segundo episódio foi um vídeo de humor gravado pela youtuber cearense Camilla Uckers, onde ela faz uma brincadeira com a avó dizendo que vai viajar à Brasília para apoiar a presidente Dilma e que virou militante do PT. O vídeo, bastante engraçado, serviu de motivo para alguns militantes e simpatizantes do governo alegarem que a reação da avó de Camilla é um absurdo, intolerante, um discurso de ódio ao partido. Sim, chegamos ao ponto onde as pessoas problematizam as esponjas utilizadas no BBB e vídeos de humor da Camilla Uckers. Efeitos da praga politicamente correta.
O que essas pessoas se recusam a enxergar é que a esponja fazia parte de uma coleção com vários modelos de esponjas decorativas, onde black power é apenas um dos inúmeros modelos, que vão de um garoto punk até a rainha da Inglaterra. Um fenômeno bem parecido com o que gerou meu último artigo, quando houve revolta geral porque a Veja usou a manchete “bela, recatada e do lar” para se referir à Marcela Temer. O diretor do programa provavelmente colocou aquela esponja de propósito, por ser esperto o suficiente para saber que isso provavelmente causaria revolta em alguns telespectadores e consequentemente mais audiência para o programa. Assim como no caso da Veja, acertaram em cheio em criar polêmica e conseguiram alta repercussão. Esquerdista (praticamente sinônimo de politicamente correto) geralmente não é muito esperto e sempre acaba dando audiência para os veículos da mídia que costuma criticar.
Pior: o Ministério Público Federal do Rio de Janeiro (MPF/RJ) abriu esta semana uma ação civil pública contra a Globo alegando “danos morais coletivos e discriminação racial”. Sim, é sério. Estamos vivendo uma onda de violência com cerca de 60 mil assassinatos por ano, o Rio de Janeiro é um dos estados com mais corruptos por metro quadrado na política e o MPF/RJ está preocupado com uma esponja. Eu sou negra e garanto a vocês que não me senti nem um pouco ofendida por essa esponja, na verdade, confesso que adoraria ter uma das esponjas da coleção na minha cozinha. Você tem que ter uma autoestima muito baixa para se sentir ofendido por algo desse tipo.
Me senti ofendida mesmo ao saber que o Ministério Público Federal, financiado pelo meu e pelo seu dinheiro, gasta tempo com esse tipo de causa. Me revolta saber que sou obrigada a financiar isso. A censura politicamente correta é tão grande que hoje você é xingado se simplesmente não consegue enxergar racismo nesse tipo de coisa. Caso esteja duvidando, basta olhar alguns comentários que meu artigo certamente irá receber depois de publicado. Aliás, não duvido que daqui a pouco o Ministério Público Federal processe a Camilla Uckers por “incitação ou apologia ao crime”. Se estão se preocupados com objetos de decoração utilizados no BBB, daqui a pouco começam a patrulhar a youtuber. E, claro, uma hora chegará a sua vez.
Até entendo o fetiche de ressuscitarem constantemente o período da ditadura militar, que acabou há mais tempo do que durou. Mas a censura daquele período perdura até hoje. Apenas adquiriu uma nova roupa e um nome mais bonitinho.