“A liberdade não se perde de uma vez, mas em fatias, como se corta um salame”. Esta frase de F.A. Hayek fica bem evidente para quem presenciou a deterioração da Fundação Getúlio Vargas (FGV) nos últimos anos.
Em 2012, ainda terminando o ensino médio, me encontrei naquela famosa fase angustiante de escolher o que cursar após o fim da escola. Não tinha muitas perspectivas quanto à faculdade no Brasil, pois já tinha noção do nível de aparelhamento da imensa maioria das universidades públicas. Considerava estudar fora do país, mas a imagem de uma faculdade voltada aos negócios, à produção intelectual e alheia às pressões de grupos políticos organizados me atraíram para a FGV de São Paulo.
Estudei e prestei apenas o vestibular da FGV, que por si só me encantou; a faculdade não aceitava o ENEM, que na época eu já percebia ser uma avaliação de muito baixa qualidade, optando por avaliar os alunos com sua própria prova. Entrei no curso de Economia sem nenhuma forma de bolsa, seja por mérito ou necessidade; apenas um consumidor comum realizando uma troca.
Já conhecia um pouco da Escola Austríaca de Economia e, conforme o primeiro ano foi passando, me desencantei com o curso por focar apenas em autores ortodoxos e instrumentos estatísticos. Fiz o que qualquer pessoa sensata faria e procurei outro curso. O produto que me foi entregue correspondia ao que eu comprei, mas não era o adequado para as minhas preferências pessoais.
Resolvi me transferir para o curso de Administração Pública, que tinha uma grade com conteúdos amplos e mais aplicação prática. Nunca fui ingênuo a ponto de achar que não seria um curso predominantemente de esquerda, mas isto nunca foi um problema. Acreditava que podia ganhar bastante com a experiência.
Nem tudo eram flores, mas a situação também não era fora do normal. A FGV era apenas uma escola com aquele ranço de esquerda que todos nós já naturalizamos no ensino médio. Nesse mesmo ano, eu e um amigo criamos o Grupo de Estudos Liberais John Galt para sanar essas deficiências que percebemos no ensino e achamos que o problema estava resolvido. Nessa época eu não sabia que, quando o assunto é cultura ou política no Brasil, pior que está sempre fica.
Ao longo dos anos fui presenciando diversos absurdos. Cada vez mais matérias obrigatórias inteiras eram transformadas em cursos doutrinários. Em “Mídias” aprendíamos não como funciona o mercado midiático, mas porque a democratização da mídia proposta pelo PT era necessária; nas aulas de “Psicologia Social” estudávamos não as obras de grandes autores como Leon Festinger, mas “aprendíamos”, em rodas de conversa, porque cada minoria possível de ser imaginada era oprimida pelo capital. Até autores clássicos como Hobbes ou Burke são “reinterpretados” pelos professores para se encaixarem no discurso progressista – se não forem reinterpretáveis são ignorados.
Os Acontecimentos
Foi neste ambiente que comecei a tecer, de forma quase que periódica, críticas aos grupos organizados de alunos de esquerda divididos quase que tribalmente em vários “coletivos”. Estes grupos têm forte apoio institucional, apesar de tomarem poucas ações concretas – nas quais identificam e contribuem para o julgamento e punição de alguém culpado por um “crime” – e muitas ações de “conscientização” que consistem em acusar todos os alunos de algo deplorável como racismo ou machismo e depois cobrar alguma forma de benesse ou poder.
Uma dessas críticas me levou à Comissão de Conduta da faculdade por ousar usar a frase “Você é traveca?” e o termo “transtorno de identidade de gênero”. A primeira frase foi dita para me opor ao coletivo de esquerda LGBT da faculdade que demandava e ainda demanda a censura da palavra “traveco” e qualquer outra palavra que possa ofender algum de seus membros. O segundo termo foi utilizado para me opor à ideologia de gênero que move o grupo, aquela que insiste a afirmar que uma pessoa que não consegue se identificar com o sexo com o qual nasceu não sofre de uma patologia. Tive que explicar toda a minha situação para uma comissão – composta exclusivamente por professores de esquerda – que aparentou entender que o evento se tratava de mera divergência ideológica, não um ato de ódio gratuito, e segui a minha vida.
Alguns dias depois veio à tona a denúncia de um ex-aluno de que a FGV estaria recebendo repasses públicos. Muito se discutiu sobre a legalidade dos repasses e nada sobre o essencial: a FGV, uma instituição de ensino privado, estava recebendo dezenas de milhões de reais dos pagadores de impostos sem nenhuma razão aparente. Neste momento a ficha caiu. Até então, eu não conseguia entender o porque esses absurdos aconteciam em uma escola que teoricamente estava sujeita às pressões de mercado.
Após conversar com os outros membros do John Galt decidimos publicar nossa carta aberta. Curiosamente, alguns dias depois, recebi a notícia de que a Comissão de Conduta, aparentemente compreensiva apesar de parcial, havia não só decidido pela minha suspensão como também estava instaurando um novo processo interno para pedir minha expulsão devido à carta. Para piorar, eles repetidamente tentaram me usar e me colocar contra meu próprio grupo de estudos: primeiro pedindo que os convencesse a publicar uma retratação em troca de minha permanência na faculdade e, posteriormente, exigindo repetidamente os nomes dos membros do grupo que recusei a dar. Nessa hora, resolvi publicar este vídeo expondo os acontecimentos:
O Resultado
Olhando para trás com as informações e o conhecimento que tenho hoje fica quase escancarado o processo de aparelhamento da FGV. O processo seletivo foi gradualmente sendo substituído pelo ENEM e outras formas de ingresso com avaliações menos criteriosas, as provas foram sendo substituídas por trabalhos em grupo para mascarar o fato de que uma boa parte dos alunos não sabem ler ou escrever corretamente e os eventos extracurriculares foram contando com cada vez menos CEOs e cada vez mais militantes profissionais de esquerda que nada sabiam sobre os assuntos em questão.
Cada vez mais os grupos de esquerda ganhavam espaço e poder de intimidação dentro da escola assim como ganhavam os professores de esquerda que recebiam também alguns cargos-fantasmas como “Coordenador de Diversidade“. Crescia também o número de bolsas e prêmios concedidos para pesquisas com metodologia fraca e de claro cunho ideológico. Tudo porque alguns burocratas que não estão sujeitos às regras de mercado acreditam que estão formando uma casta de administradores e juristas benevolentes e apolíticos que salvará o Brasil.
Ao contrário do que aconteceu no curso de Economia, desta vez não recebi o produto que comprei e pelo qual paguei caro. Paguei por um ensino de elite em uma faculdade privada cujo objetivo é educar e qualificar indivíduos. Recebi um ensino extremamente precário em uma faculdade que, apesar de privada no papel, é tão dependente de subsídios e repasses públicos que funciona como cabide de empregos cujo objetivo é legitimar um estado inchado e doutrinar jovens com ideologias coletivistas pseudocientíficas.