Uma das táticas preferidas do “lobby da cultura” no Brasil tem sido justificar o dinheiro dos pagadores de impostos (em variadas modalidades, mas que aqui chamaremos genericamente de “subsídio”) destinado ao setor alegando que ele traz “alto retorno” por cada real investido.
De fato, ao ouvir um artista engajado falando sobre o tema, pode até parecer que o “investimento em cultura” é o melhor negócio do mundo: “A cada um real investido, retornam 10 reais”, ou algo do gênero é o que se diz.
O que tal discurso não explica – na verdade, nem ao menos chega perto de abordar – é por que um investimento com garantia tão sólida de “retorno” precisa ser quase integralmente subsidiado pelos pagadores de impostos para continuar existindo. Afinal, se o negócio é tão bom assim, seria previsível que os próprios artistas – envolvidos na produção dos filmes, peças de teatro, espetáculos musicais, exposições, etc – investissem seus próprios recursos nos projetos, de maneira dinâmica e constante, para garantir a si mesmos taxas de retorno “altamente vantajosas” em vez de passar meses (às vezes, anos) mobilizados em aprovar projetos para concessão de incentivo fiscal ou fomento direto, consumidos pelo labirinto da burocracia, atolados em formulários e papelada ou em gabinetes de políticos implorando pela continuidade das políticas de “proteção ao setor”.
O discurso dos artistas ignora tal aspecto porque o “negócio da cultura” – que é, na verdade, o negócio da cultura estatizada – só existe e continua funcionando em função de sua natureza, por princípio, “estatizada” – ou seja, dependente essencialmente dos mecanismos de reserva de mercado e subsídio. Sem a reserva de mercado e o subsídio, ele deixaria de existir em sua forma consagrada (que é aquela de interesse daqueles artistas): ora porque os produtos culturais resultantes são desinteressantes para o mercado, ora porque são fruto de uma fórmula financeira pesada demais para ser suportada na esfera privada (como as “comédias da Globo” que atingem milhões de espectadores nos cinemas mas são tão caras que, sem subsídio, inviabilizariam-se por completo).
Considerar simplesmente o “retorno esperado” quando se fala de financiamento da cultura sem levar em consideração o fator “risco” – que é o que realmente importa – impede que o negócio da cultura seja tratado de maneira efetivamente “empresarial”. Pode parecer tremendamente sedutor investir na produção de um filme, por exemplo, esperando um retorno de 100% em menos de um ano. Mas esta é apenas parte da questão (e possivelmente não a mais importante): o risco envolvido é tão alto e a possibilidade de perder todo o valor investido é tão concreta (como tantas vezes acontece no negócio do cinema) que apenas com a garantia do subsídio tal “negócio” se torna realmente viável (e este ponto vale de maneira ainda mais crítica para produções de teatro, shows, etc) e atraente quando comparado a uma infinidade de outros investimentos possíveis.
O negócio da cultura (ao menos no Brasil) só é “grande” graças ao subsídio. Quem assume o risco é o pagador de impostos – que nada tem a ver com isto – e está sujeito a regras mais duras e menores “taxas de retorno” sempre que pretende viabilizar seus próprios projetos ou investir seu dinheiro suado, mas que ainda assim corre riscos que poucos “artistas engajados” estão dispostos a correr.